terça-feira, 30 de junho de 2015

Viagem à Terra Santa em 2014 - 18. Em 1 de maio. De Qumran a Tel Aviv.

18. De Qumran a Tel Aviv

O recomeço da viagem, no ar condicionado do autocarro a seguir ao almoço, seria um bom momento para fechar os olhos por alguns momentos e descansar. Mas a cabeça não sossegou porque não queria deixar as ruínas de Qumran pura e simplesmente para trás e foi levantando questões.

De que se alimentava a comunidade de Essénios, ou YAHAD? Onde e como cultivavam cereais para fazer o pão? E de onde lhes vinha água para beber? E onde tinham vinha para fazer o vinho?

Vendo hoje a mancha azul do Mar Morto a partir do local das ruínas, fica-se com a ideia de que o Mar não fica assim longe.
 
 
Já vimos, num apontamento anterior, que a superfície do Mar se reduz a olhos vistos. E que a água é tão salgada que nenhum peixe lá consegue sobreviver. Mas há dois mil anos, seria assim?

E depois como terá sido o encontro do exército romano com aquela comunidade de homens humildes, desarmados, inofensivos? Quantos seriam eles? Como e porque os mataram?

Os Essénios eram homens cultos, inteligentes. Previdentes o bastante para irem esconder os manuscritos numa gruta da quase inacessível montanha. Mas terão sido imprevidentes ao ponto de terem metido todos os ovos no mesmo cesto? Se foram previdentes haverá seguramente mais manuscritos noutras grutas, noutros potes.

Tinha formulado a intenção de ver o mais possível da paisagem e fotografar, sempre que possível, pontos de interesse. Afinal talvez nunca mais volte a passar por aqueles caminhos. E assim fui tirando fotografias para ficar com uma ideia de como é o caminho desde Qumran até Tel Aviv.

Junto à estrada, apareceu, entretanto, uma sucessão de lojinhas, com uma grande variedade de artigos coloridos em exposição. E até havia um restaurante com muito bom aspeto. Podíamos lá ter ido para nos refrescarmos com uma bebida.



Mas prosseguimos o nosso caminho.
 
O autocarro estava quase a deixar a estrada noventa para se dirigir para a número um e eu a maquinar nestas coisas ao ponto de me distrair e deixar de ver a paisagem.

E foi um camelo isolado numa vasta encosta que arrebanhava o pouco alimento que ali poderia encontrar que me chamou a atenção e me fez acordar.


Por um pequeno vale vi aquilo que parecem ser os vestígios de um caminho muito antigo que se sobe por entre as colinas até se perder no horizonte. Talvez por ali tenha passado Jesus Cristo e mais do que uma vez.


E, um pouco mais à frente, o aviso de que iríamos ter uma barreira de controlo, ou seja, um posto fronteiriço da passagem da Palestina para Israel.


 
 
Não sei bem de que zona se tratava, mas, como o guia Sebastião estava connosco, deveria ser daquelas em que os judeus podem entrar e sair sem grandes formalidades.

O que não evita que haja avisos desaconselhando os israelitas a ultrapassarem certos pontos para localidades palestinianas.
 

E, não muito longe, apareceram os sinais mais visíveis da divisão da Terra Santa entre as nações israelita e palestiniana: as barreiras de arame farpado e os altos muros de separação. 

 

Certamente que em ambas as nações haverá homens bons que desejariam ver estas barreiras removidas, num gesto de um grande abraço de paz e fraternidade.

A viagem continuou, aparecendo, pelas encostas, povoações cada vez maiores. Era o sinal de que estávamos a passar perto de Jerusalém.

Durante alguns minutos houve um carro da polícia que nos fez  casualmente companhia.

 
E o facto de já estarmos numa zona mais densamente povoada não impediu de sermos surpreendidos por duas lindas manchas agrícolas, uma loura de trigo e outra verde de vinha.

 

Há um grande viaduto em construção que, uma vez concluído, irá facilitar em muito a viagem entre Jerusalém e Tel Aviv.

 

 
E, já perto de Tel Aviv, veio a prova de que também na Terra Santa há comboios.
 

sábado, 27 de junho de 2015

Viagem à Terra Santa em 2014 - 17. Em 1 de maio. Em Qumran.

17. Em Qumran

Qumran é um dos locais que chegou até aos nossos dias pelo lado do mérito da memória dos vencidos e não dos vencedores.

Contudo, esta localidade passou a ser ainda mais conhecida a partir do momento em que, em 1947, um pastor beduíno, deambulando à procura de uma sua cabra perdida, entrou casualmente numa gruta e encontrou lá vários potes de barro, com o aspeto de serem muito antigos.
 
Com curiosidade foi verificar o que continham.
 
Talvez esperasse encontrar um tesouro de ouro ou algo parecido. Mas o que lá estava eram uns velhos panos de linho enrolados à volta de uma espécie de papéis antigos. Coisa sem interesse comercial para ele.

Por ele próprio ou por terceiros, a descoberta chegou ao conhecimento das autoridades que foram ver o que era aquilo.
 
Nem queriam acreditar. Tiraram dos potes 190 manuscritos enrolados em panos de linho, muito bem conservados.
 
  Vimos alguns dos originais destes manuscritos no Santuário do Livro, no Museu de Israel. 
 
Concluíram que tinham ali sido guardados há mais de dois mil anos. O bom estado de conservação dos manuscritos, atribuído ao clima seco do deserto, permitiu ver que eram trechos com histórias bíblicas.

Isto aconteceu na mencionada localidade de Qumran, perto da margem ocidental do Mar Morto, que hoje é uma importante estação arqueológica. 

Era esse o local que agora íamos visitar.


Começamos por entrar num pequeno auditório onde vimos um documentário sobre os homens que ali viviam há dois mil anos. Chamaram-lhes Essénios. Era uma espécie de ordem religiosa de homens adultos, cultos, que se dedicava ao estudo bíblico e à contemplação. Estabeleceram-se ali por volta do ano 150 a.c.. Acreditavam que o Messias estava para chegar a todo o momento e preparavam-se fazendo jejum, seguindo uma rigorosa disciplina monástica e purificando-se várias vezes ao dia através de abluções de água. Pensa-se que João Baptista chegou a fazer parte dessa comunidade. E há até quem afirme que o próprio Jesus Cristo ali esteve também, o que, de certo modo, permitiria explicar a grande lacuna  de informação que existe em relação ao período que vai desde o início da sua adolescência até ao começo da vida pública.

No ano 68 d.c., chegaram ali os romanos em perseguição aos judeus revoltosos e, vendo tantos homens juntos, logo os consideraram inimigos e os exterminaram por completo.
 
Felizmente os vencidos tiveram a ideia de esconder a tempo os manuscritos numa das grutas da montanha.

Depois de vermos o filme, aliás muito interessante, partimos para a visita à estação arqueológica. O guia Sebastião acompanhou-nos, dando algumas explicações. Mas foi pena que não tivéssemos tido um guia local com saber e experiência, para nos explicar melhor a importante documentação arqueológica que ali está sendo descoberta. Mesmo assim não nos podemos queixar muito, porque no local há cartazes explicativos. E como houve o filme...

O passeio debaixo de um sol ardente e pela hora do calor não deixou muita margem para vermos tudo com cuidado. As fotografias que tirámos são agora muito úteis para, a posteriori, revermos esse histórico local.

 
 
O parque de Qumran visto da montanha.
(Fotografia informativa em exposição no local)
 
A comunidade seguia uma vida monástica com uma regra própria, austera, cegamente obedecida.
 
 
"A refeição comunitária era o acontecimento central na vida diária da comunidade YAHAD. Ao meio dia, os membros suspendiam o trabalho, lavavam-se no banho ritual e juntavam-se no refeitório. Um ambiente de santidade envolvia o local, que também era usado como sala de reuniões. Era servida a cada membro uma modesta porção de pão e de alimento cozinhado. A refeição era presidida por um sacerdote. Depois de este abençoar a comida e os presentes, a refeição decorria em silêncio. No local foram localizados os vestidos de uma sala larga e comprida - provavelmente o refeitório e a sala de reuniões. Numa despensa próxima foram encontradas centenas de tigelas impecavelmente arrumadas em pilhas e vários utensílios de mesa e de cozinha."

  
 
 
 
 
"Toda a congregação deve ocupar um terço de cada noite do ano na leitura do Livro e nos estudo da lei, abençoando-se mutuamente." (Regra n.º VI, 7-8).
 Os membros da comunidade de Qumran preocupavam-se com o estudo dos livros da Bíblia. Centenas de lucernas de barro foram encontradas nesta sala, o que valida a suposição de que a mesma fosse usada para a leitura e o estudo noturnos."
 
 
 "Nesta sala foram descobertos bancos e mesas feitos de tijolos ligados com massa de gesso. Também foram encontrados três tinteiros em metal e barro, o que comprova o facto de que os escribas que copiaram os manuscritos se sentavam aqui. Quando o exército romano se aproximava de QumRan, no ano 68 d.c., os escribas colocaram os manuscritos em potes de barro e foram-nos esconder nas grutas da montanha próxima de Qumran."
 
  "Eles deviam comer em comum, rezar em comum e deliberar em comum. E quando a mesa estava preparada para a refeição e o novo vinho servido, o sacerdote que presidia era o primeiro a estender o braço para abençoar e provar o pão e o vinho. (Regra comunitária VI, 2-5).
 Os membros da comunidade reuniam-se nesta sala para as refeições e para as deliberações doutrinais."
 
 
 
"O banho ritual. As piscinas para o banho ritual tinham uma separação entre as escadas descendentes, os que desciam estavam em estado impuro, e as ascendentes, os que subiam já estavam purificados, para evitar o contacto entre eles. De notar as rachas nas escadas provocadas por um terramoto ocorrido no ano 31 a.c."
 
 
   
 
 
Lá em cima, a meio da montanha, há um numeroso grupo de pessoas que visitam as grutas onde foram encontrados os potes com os manuscritos.
 
Nós não iremos lá pois seriam precisas mais duas horas. E também uma ou duas garrafas de água suplementar.

Visitada a estação, foi indispensável fazer uma pequena paragem para descansar. Uma vez recuperadas as forças seguimos para o almoço.

 
A sala de jantar do restaurante é ampla, mas com pé alto relativamente baixo, o que a torna bastante barulhenta. Acomoda muita gente ao mesmo tempo e as refeições são servidas segundo o tipo de cantina de empresa, com tabuleiros e tudo.


Num ambiente assim, não foi possível o grupo ficar junto, pois as pessoas iam-se sentando onde viam um lugar livre.

A saída do restaurante dá diretamente para uma loja de recordações. Alguns companheiros aproveitaram para fazer compras e outros para ver os artigos expostos. Eu passei mais depressa e aproveitei para, no parque de estacionamento dos autocarros, fazer a minha atualização em relação ao correio e às notícias de Portugal e do mundo. Durante a viagem verifiquei que isso é possível, pois a maioria dos autocarros já tem internet, e há sempre um ou outro com a rede completamente livre.

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Viagem à Terra Santa em 2014 - 16. Em 1 de maio. De Ein Bokek a Qumran

16. De Ein Bokek a Qumran

 O início da viagem em 1 de Maio teve os procedimentos do costume. Primeiro o fechar das malas e certificação de que as nossas tinham, de facto, ficado arrumadas na bagageira.
 
 
 
 Depois, já dentro do autocarro, a contagem e a recontagem para ninguém ficar para trás. E, a seguir, alguns minutos de estrada, em silêncio, a olhar para aquela paisagem seca, árida, cheia de mistérios.
 

Veio o bom dia dos guias seguido de um breve pensamento de reflexão e oração orientado pelo P. Artur. E, por fim, a informação do guia Sebastião sobre o programa do dia.

O nosso primeiro ponto de paragem seria Qumran.

Até lá seriam talvez uns 50 quilómetros, pois este local histórico fica quase junto ao vértice norte do Mar Morto, portanto já muito perto de Jericó. Seguiríamos assim pela estrada 90, fazendo o mesmo percurso do dia anterior, mas em sentido contrário.

Depois seguiríamos para Tel Aviv e Jafa, passando perto de Jerusalém. Em Jafa, visitaríamos a cidade histórica e a praia e jantaríamos. Após o que seguiríamos para o aeroporto para as formalidades do regresso a Portugal.

Mas ainda é cedo para falarmos no regresso, pois  há ainda histórias para contar.

Por exemplo, o percurso de Ein Botek até Qumran tem pormenores interessantes que se destacam no meio da cor predominante, o ocre claro, que, pela sua quase contínua aridez, nos faz secar a garganta e nos provoca sede só de o vermos.
 
 
A certa altura vemos algo que parece ter sido uma estrada a ligar as duas margens do Mar.Talvez tenha sido usada pelos jordanos antes da guerra de 1967. Agora parece acusar os efeitos do abandono e das intempéries.

A estrada 90 ora se afasta do Mar e sobe até meio da encosta, ora se aproxima dele, mesmo quase até ao pé da água.


Andar pelas margens do Mar Morto requer cuidados especiais, pois a secagem da água, devido ao excesso de sal, cria grandes poços vazios, autênticas armadilhas, onde as pessoas podem cair. Há avisos nos locais de mais risco, mas, mesmo assim, todo o cuidado é pouco.


E, por vezes, encontramos monumentos espontâneos.

 
 
Quais as memórias que estarão por detrás deles? Seria interessante podermos saber.
 
 
E qual a história deste barco, em terra seca e bastante afastado da água?
 
Depois vemos largas levadas que levam a água do Mar Morto para a indústria de extração de sais, muito contribuindo para a acentuada redução da sua superfície.


Aparentemente os interesses comerciais sobrepõem-se aos ecológicos e não há nada a fazer.

Um pouco mais à frente, vemos um pequeno aeroporto no deserto que até parece meio abandonado.


E, não muito longe, uma placa diz-nos que estamos na zona do Megibot Dead Sea Regional Council.

 
Utilizando a linguagem da nossa organização administrativa, diríamos que é uma câmara municipal com seis freguesias e apenas mil cidadãos. É a câmara mais pequena de Israel. Na linguagem local são seis contestados colonatos na margem ocidental, em terras sobre o controlo da Autoridade palestiniana, coordenadas por um conselho regional, que tem a sede em Vered Yeriho.
 
Apesar de estarmos num deserto árido e inóspito, é grande o esforço humano para criar oásis. As manchas de palmares são os resultados de sucesso mais visíveis.
 
 
 
 
Já falei num apontamento anterior de umas marcas feitas no começo do século passado numas rochas junto à estrada para monitorizar o nível das águas do Mar. Deu-se o caso de lá termos parado no regresso e podermos ver melhor essas marcas e a informação aí disponibilizada sobre as mesmas.  
 
 

 
P.E.F ROCK (A rocha da observação)
 
Entre os anos 1900-1913, e, de novo, em 1917, o Fundo de Exploração da Palestina mediu o nível das águas do Mar Morto usando esta rocha. A marca vermelha que indicou o nível das águas há mais de um século ainda pode ser vista hoje.
 
Hoje o Mar é observado com regularidade e com meios modernos.
 
Muito perto do local está este moderno observatório meteorológico.
 
 
Os sinais da estrada dizem-nos que estamos a chegar a Qumran que será o tema do nosso próximo apontamento.