quarta-feira, 7 de julho de 2010

O MEU FASCÍNIO PELAS FILARMÓNICAS

O meu fascínio pelas filarmónicas vem de muito longe, praticamente desde o começo da minha vida neste mundo. Nas festas da minha aldeia ou nas romarias de terras vizinhas, a banda e os foguetes mexiam realmente comigo, alvoroçando-me num júbilo que não conseguia conter. Invariavelmente sentia-me levado para o mais perto possível desses homens fardados com instrumentos brilhantes que libertavam afinadas melodias. Adorava servir-lhes de estante e  segurar-lhes abertas as partituras. Lembro-me de um dia em que, integrando um grupo de crianças, seguia multiplicando os passos à frente da filarmónica, a Música da Peroviseu, que em marcha de alvorada desfilava por uma das ruas. Eu seria um dos garotos mais pequenitos. A certa altura, um dos músicos da frente da formação pisou o meu calcanhar e descalçou-me. Passei uns segundos de verdadeira aflição, perdido no meio das filas a tentar recuperar o meu sapatito que ia sendo chutado de um lado para o outro pelos músicos que passavam. Levei mesmo um encontrão que me deixou caído no chão a ver a banda pelas costas.

Sempre senti uma curiosidade enorme em relação às notas musicais. Na instrução primária, um dos livros tinha uma canção numa das páginas. Estava esperançado que, chegando lá, o Professor explicasse como é que aquilo se interpretava. Como vi que ele ia saltar a página perguntei-lhe:

- Sr. Professor, como se lê a letra de músico?

Ele respondeu tão somente:

- Meu palerma, a letra de músico não se lê, canta-se.

Isto não impediu que, ainda hoje, eu sinta grande atracção por um concerto de filarmónica onde quer que ele ocorra. Como passeio com frequência pelo Jardim da Estrela, detenho-me, por vezes, um pouco, junto ao coreto, imaginando-o a ser utilizado por uma grande filarmónica.

O tecto do coreto do Jardim da Estrela

E não é que, no fim de semana passado, dei notícia de que tocaram aí duas bandas. Por pouca sorte, já só assisti ao dispersar. Mas abordei uma simpática tocadora de clarinete da Sociedade Filarmónica Silvense (Silves) que me pôs ao corrente do acontecimento. Nesse dia, estavam em Lisboa dez bandas que, na parte da manhã, tocavam dispersas por vários jardins da cidade e que, ao fim da tarde, desfilariam, em arruada, pela Rua Augusta na direcção do Rossio, onde ocorreria um grande concerto final.

O Rossio é um dos meus locais preferidos de Lisboa. Adoro sentar-me numa das esplanadas laterais e ver a cidade desfilar à minha frente. Numa tarde quente de verão, é possível observar a passagem de um número interminável de pessoas todas diferentes. Mais vestidas e quase despidas. Cores garridas e cores discretas. Umas elegantes e outras de cinturas avantajadas. Umas de mãos livres, outras segurando objectos dos mais diversos tipos e feitios. É o rapaz maltrapilho que vem pedir uma moeda ou o cigano a tentar vender óculos de sol ou relógios contrafeitos. Vi, a certa altura, passar uma gigantona, talvez americana, tão grande e tão gorda que as banhas ondulavam como um oceano, segundo o movimentos da perna em que se apoiava.


Que cidade tão diferente e tão bonita!

A certa altura apareceu uma jovem tocadora de uma das bandas, com o seu saxofone dependurado ao pescoço, olhando agitada para um lado e para o outro como se andasse perdida e procurasse alguém ou alguma coisa.



E eis que entrou apressada num dos estabelecimentos e saiu pouco depois refrescando os lábios com um valente cone de gelado.

E por cima de toda esta paisagem, abafando todos os ruídos, lá veio o concerto das bandas com numerosos instrumentos e tambores de vários tamanhos, tocando trechos dos mais diversos tipos e ritmos. Mesmo com o trânsito a fluir normalmente, faziam-se ouvir as suas músicas.

E, no fim, foi a surpresa. Uma banda integrada por numerosos músicos jovens das dez filarmónicas participantes deu o concerto final do encontro. Tocou não só músicas modernas, mas também trechos populares e um ou outro trecho clássico, chegando mesmo a acompanhar o tenor João Campos numa ária. Por fim, acompanhou este cantor em dueto com a cantora Rita Biscoito numa extensa rapsódia de músicas populares, onde não faltaram O Malhão e a Menina Estás à Janela.

Essa nova banda de jovens músicos já tem nome. É o “Com’Paço 10”. O empenho, competência e dedicação que vi nos jovens instrumentistas são sinais prometedores.



Tudo isto foi o III Festival de Bandas de Lisboa. Gostei. Que venha o IV.

Muitos parabéns aos jovens do “Com’Paço 10”.

P. S. - Pena é que a Música da Peroviseu não tenha participado neste encontro.

2 comentários:

Billy disse...

Tão giro! Parecia estar a ouvir a banda a tocar. :)

(os teus posts têm o condão de transmitir sons e cheiros de uma forma muito vívida)

PTuny disse...

Ainda bem que gostas e eu sinto-me feliz só porque gostas. Beij. PT