terça-feira, 25 de novembro de 2008

COM A PRISÃO DE OLIVEIRA COSTA A SUPERVISÃO BANCÁRIA DEVERIA VESTIR LUTO PESADO ...

1. Na passada quinta-feira, estamos a falar de 20 de Novembro de 2008, foi preso Oliveira Costa, ex-presidente e CEO do Banco Português de Negócios (BPN). Na sexta-feira, o juiz aplicou-lhe a medida de coacção máxima, a prisão preventiva, com base no alegado receio de fuga e na gravidade dos factos. Em princípio, a prisão preventiva só é aplicável a arguidos de factos criminosos a que corresponda uma moldura penal superior a 5 anos. Se não estou em erro, Oliveira Costa tem presentemente 73. E fácil adivinhar que, se vier a ser condenado, o seu envelhecimento não vai ser tranquilo.

2. A prisão de Oliveira Costa deixou-me verdadeiramente triste. No começo dos anos oitenta ele era o Director do Departamento de Supervisão Bancária do Banco de Portugal. Foi o meu Director quando eu trabalhei nesse Departamento e deixou-me as melhores impressões como profissional, como trabalhador incansável e como pessoa ousada, muito séria. Vejo-o com esse perfil e não consigo compreender a alhada em que se encontra. Esta confusão não encaixa, de modo nenhum, na imagem que tenho dele. Em meados dos anos oitenta seguimos percursos diferentes. Mas sempre mantivemos contacto de amigos e jamais vislumbrei qualquer situação que me permitisse alterar essa boa imagem.

A Supervisão Bancária deveria vestir luto pesado. Afinal Oliveira Costa foi um homem responsável pela Supervisão… Terá esta sido suficientemente preventiva no caso do BPN?

Senhores investigadores, averiguem tudo muito bem! Parece-me que há histórias sérias a tender para serem mal contadas. Para mim, Oliveira Costa, apesar de, presentemente, se encontrar em maus lençóis, continua a ser um homem bom e trabalhador que nunca ostentou riqueza pessoal imerecida. Não gostaria de ver conclusões que me fizessem mudar esta opinião.

3. Seguiram-se as entrevistas em tom excessivamente nervoso de Dias Loureiro, que foi colaborador de Oliveira Costa no Grupo a que pertencia o BPN, e, ontem mesmo, do Governador do Banco de Portugal. Ambos aparentaram estar muito à tona dos nervos e pouco seguros em questões fundamentais. Parece claro que o sistema financeiro é hoje um enorme barril de pólvora com o rastilho muito exposto. Um morrão de cigarro, uma distracção ou uma simples brincadeira de mau gosto podem provocar uma verdadeira catástrofe. No meu ponto de vista, estes dois senhores teriam feito melhor se estivessem caladinhos. O primeiro, porque sendo uma pessoa experiente em política, deveria ter tido o cuidado de não entrar na roda do diz-se que disse o que eu não disse. Mesmo que tivesse razão, deveria saber que a contradita seria de esperar, e em termos violentos ao ponto de ser havido como mentiroso. Como conheço relativamente bem a outra parte, António Marta, opino no sentido de que Dias Loureiro está, no mínimo, confuso e equivocado. Por ouro lado, o Governador do Banco de Portugal não deveria ter sido tão explícito em relação ao Banco Privado Português, que afinal deixou cair na opinião pública como uma banqueta em queda letal, de somenos importância para merecer significativo apoio estatal.

Meus senhores, cuidado, que há fogo em jeito de chegar ao rastilho….

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O ESTADO É PESSOA DE BEM ...

Isso era dantes. Agora já não é assim.

Vejam o que acontece com os empresários do computador Magalhães. Tudo indica que possa ser um empreendimento de muito sucesso. Mas o senão tinha de aparecer e da parte de quem? Dos jornais que deram a notícia de que esses empresários estão sob a justiça fiscal por suspeita de fraude? Ou do Fisco, que é Estado, que deixou sair a notícia para os circuitos da informação?

Mas há sinais bem mais evidentes de que já não é assim, mesmo à porta da minha casa. Parece irreal ...

Há por aí muita falta de parques de estacionamento automóvel. E, por isso, o sinal de estacionamento proibido ganhou um estatuto de “estacionar se não atrapalhar o trânsito.” A cidade de Lisboa está cheia de exemplos destes.

Há, contudo, automobilistas mais respeitadores que dão mais uma voltinha até encontrarem uma rua onde não haja sinal de proibição nem nada que, aparentemente, proíba o estacionamento. E assim, muito desses cumpridores vêm estacionar na minha rua. Vejo, com frequência, aqui carros com matrículas estrangeiras. Para quem aqui deixa o carro parece estar tudo de acordo com a Lei.

Para quem aqui mora, o inferno é constante. A rua tem dois sentidos onde se podem cruzar apenas dois carros ligeiros. Um pesado e um ligeiro já não passam e, por isso, gera-se com frequência a barafunda. São frequentes os gritos, os insultos com a grosseria dos palavrões do jargão mais genuíno da língua portuguesa e até já presenciei agressões. Esta rua, num momento de confusão, pode transformar-se num problema de Estado. É que, a uma centena de metros, mora o Presidente da República que, seguramente, por aqui passa muitas vezes. Por outro lado, há no bairro diversas embaixadas. Que pensarão os embaixadores quando se vêem entalados numa confusão destas?

Ainda, há poucas semanas, pude ver da minha janela uma cena hilariante. Polícias gesticulando desesperados para os automobilistas parados na rua mas que não conseguiam sair dela. Libertaram-na a tempo de a comitiva da Senhora Condoleza Rice passar sem dificuldades, provavelmente para ir a casa do embaixador do seu País que fica a menos de 300 metros. Também vi há dias um Ministro, até podia dizer o nome pois é uma figura muito conhecida, dentro do seu carro, ao lado do motorista, a olhar para um lado e para o outro, numa visível ânsia de querer passar por cima de tudo e de todos para se libertar da confusão.

E é aqui, no ponto em que menciono o Ministro, que o Estado vai entrar nesta história.

Durante um ou dois dias os carros estacionam na Rua sem dificuldades. Afinal não há nenhum sinal a proibir. É certo que já houve, mas os sinais desapareceram. Ao terceiro aparece uma carrinha que estaciona no primeiro espaço que encontra. Saem dela polícias apressados que bloqueiam todos os carros sem contemplação alguma. O resultado é visível nesta fotografia.



Depois vão com a carrinha para uma rua contígua. As pessoas chegam, ficam atordoadas a olhar de um lado para o outro. Lêem o aviso de bloqueamento. Telefonam para o número nele indicado. Vão pagar a conta que lhes é liquidada. E finalmente lá vem o senhor polícia a libertar o carro.

Para aqueles que são mais demorados a solução é mais penosa. Chegam ao local e não vêem o carro. Com sorte, alguém os informa do que aconteceu. O carro foi rebocado pela polícia para um parque que há lá para os lados do Colombo. A conta para o libertar vão ser cerca de cem euros.

Por vezes a rotina do bloqueamento acelera-se para um ritmo de um dia de parqueamento livre e dois dias seguidos de bloqueamento imediato.

E é assim. Sem sinais nem avisos, o Estado actua como um raposão surpreendendo as presas indefesas ou como um garoto rabino que arma as ratoeiras para apanhar taralhões.

Claro que os senhores agentes da Lei não têm culpa e cumprem o melhor que podem as ordens que lhes são dadas.

Justificações que dão:

- podemos bloquear e rebocar qualquer carro numa rua em que estejam a impedir o trânsito;
- só não bloquearíamos se houvesse no local um sinal azul com indicação de parque.

No fundo, toda a gente está de acordo que o trânsito na Rua é sensível e que não deve haver estacionamento. Mas o que claramente falta é a vertente de pessoa de bem que o Estado deve ter. Bastaria informar devidamente os cidadãos marcando os dois lados da Rua com uma lista amarela e afixar sinais de estacionamento proibido e de reboque .

É preciso, em resumo, fazer um jogo limpo.

Esclarecimento: é a Rua Santana à Lapa, no troço entre a Infante Santo e a Buenos Aires.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

20 de Setembro de 2008 – Casino da Póvoa, Fernando Pessoa e o cineasta Manoel Oliveira

No sábado passado, 20 de Setembro de 2008, houve festa no Casino da Póvoa para comemorar os 40 anos da Varzim-Sol, sociedade concessionária do jogo naquele Casino. Foi uma festa leve e muito agradável em que o ponto alto foi, para mim, o Bolero de Ravel tocado ao piano com arte sentida e inspirada por três bons craques portugueses: Mário Laginha, Bernardo Sassetti e Pedro Burmester.

Como um evento nunca vem só, comemoraram-se também os 120 anos do nascimento de Fernando Pessoa, efeméride que ficou assinalada com uma bonita estátua em mármore erguida no largo em frente ao Casino.

Foi pena não ter encontrado na festa a Directora de recursos humanos da Varzim Sol, Dr.ª Carla Santos Silva, que tem o privilégio de fazer anos no mesmo dia que a Varzim Sol, empresa onde trabalha, e a particularidade de fazer também 40 anos. É compreensível que tenha querido ir comemorar o seu aniversário noutras paragens.

Mas não menos importante do que aquilo que referi, foi a oportunidade que tive de estar a jantar quase ao lado do nosso grande Manoel Oliveira. E que surpresa: quando o baile começou, foi anunciado que a primeira música, a valsa do Danúbio Azul, lhe era dedicada, pois foi no Casino da Póvoa que ele conheceu a sua mulher. E feito o anúncio, logo ele se levantou e dirigiu agilmente para a área da dança, enlaçando-se graciosamente na sua companheira e movendo-se ao som melodioso da conhecida valsa. Claro que as palmas só acabaram quando a dança acabou e ele se começou a dirigir para o seu lugar à mesa onde se sentou, aliás sem precisar de qualquer apoio. Que maravilha poder chegar aos 100 anos com um aspecto tão saudável e jovem.

E agora a expressão da minha vaidade. Estando eu perto do Manoel Oliveira, não resisti dirigir-me a ele, dizer-lhe que o admiro na sua longevidade e na arte do cinema. Ele, de modo muito simpático e afável, estendeu-me a mão e disse apenas: estou muito sensibilizado!

Para terminar desejo longa vida à Varzim-Sol, à memória de Fernando Pessoa, à Dr.ª Carla Santos Silva e ao Senhor Manoel de Oliveira!

quarta-feira, 23 de julho de 2008

DISCOS EM VINIL.... E... GUINÉ OUTRA VEZ


Vejam só. Comprei agora um trambolho bota-música que tem rádio, toca CD’s e roda no prato os velhos discos de vinil. Mas o interessante deste aparelho é que pode converter as músicas dos vinil ou dos CD’s em MP3. Foi esta característica que me influenciou no sentido da aquisição. E o primeiro vinil que fui procurar para ouvir no novo aparelho foi o disco que, de longe, eu ouvi mais vezes na minha vida. E não só eu. Muitos dos camaradas que estiveram comigo no Olossato talvez se lembrem das vezes sem conta em que os sons de Marianne se propagaram nas malhas do ar quente e húmido que nos abafava. E por que é que eu gosto tanto deste disco? É que no fim de Novembro e na primeira quinzena de Dezembro de 1968 tive oportunidade de sair da Guiné e vir de férias à Metrópole. Vim e regressei na carreira da TAP. Pagando eu, claro, como um turista normal. E nessa ocasião a minha namorada (Mariana) ofereceu-me este disco. Lembro-me de passear na baixa de Lisboa e de ela o ter comprado na véspera de me ir embora. A Rua Nova do Almada estava cheia de arcos de luzes com enfeites de Natal. Despedi-me então da cidade com um adeus cheio de pena por não poder passar cá as Festas, que já passei no Olossato ouvindo repetidamente, no nosso gira-discos colectivo, a canção Marianne, do Sérgio Endrigo. Que é bem bonita por sinal. Não concordam?

Só mais uma nota. O Sérgio Endrigo representou a Itália no concurso da Eurovisão de 1968 cantando esta bonita canção. Pode ver no

(www.youtube.com/watch?v=CEfuHh9aIxQ&feature=related)

Vale a pena esperar um pouco pelo download.

sábado, 31 de maio de 2008

MALDITAS PRAXES

MALDITAS PRAXES ... E ENTÃO NA CHEGADA À GUINÉ EM 1968....

No início da semana passada, os jornais noticiaram que o Tribunal de Santarém condenou os sete arguidos do caso das praxes violentas na Escola Superior Agrária de Santarém pelos crimes de ofensa à integridade física agravada e de coacção na pessoa de uma colega.

Aos sete arguidos foram aplicadas penas de 160 dias de multa, proporcionais aos vencimentos de cada um, sendo a máxima de 1600 euros e a mínima de 640 euros.

O julgamento resultou de uma participação feita pela ex-aluna da instituição Ana Francisco Santos, em Março de 2003, que apresentou queixa das praxes violentas a que foi sujeita na Escola Superior Agrária de Santarém em Outubro de 2002.

Os arguidos, cinco homens e duas mulheres, pertenceram à Comissão de Praxes no ano lectivo de 2002/2003. Ana Francisco foi "barrada" com excrementos de porco no rosto e no corpo e obrigada a fazer o pino sobre um bacio cheio de bosta de vaca. Na sequência destes actos e da participação ao Ministério Público, Ana Francisco foi obrigada a abandonar a escola e a interromper o curso.

O juiz Duarte Silva considerou que "os actos praticados neste caso constituem crime, pois ultrapassaram os limites do que são as praxes e vão muito além do mínimo eticamente aceitável para pessoas com o nível cultural e ético correspondente ao grau académico que pretendem alcançar". O juiz advertiu ainda os arguidos de que "os crimes pelos quais foram condenados são graves e punidos com penas até 4 anos de prisão", deixando assim, uma mensagem ao meio académico.

Adiantou que "as praxes são práticas socialmente admissíveis, desde que não ultrapassem os limites da lei e não sejam aplicadas contra a vontade dos caloiros". O tribunal justificou "a opção pela aplicação da pena de pagamento de multas pelos arguidos, em lugar da condenação à pena de prisão", com o facto de "estarem socialmente integrados".

Estou inteiramente de acordo com a decisão do Tribunal e acho mesmo que as penas deveriam ser mais severas.

A referência a esta notícia é o ponto de partida para eu continuar o relato da minha chegada à Guiné que iniciei com o post anterior.

Aterrámos em Bissau no dia 24 de Abril de 1968, ao começo da tarde. Como viajávamos em avião militar, as formalidades eram mínimas e rapidamente vimos as nossas malas e sacos num monte, na pista, ao lado do avião. Cada um tirava as suas e dirigia-se imediatamente para a saída, passando por um pouco confortável barracão que servia de aerogare. Víamos os outros militares a entrar despachadinhos em jeeps e carrinhas que os esperavam e a desaparecerem no horizonte da estrada. Como éramos novos no local perguntámos como podíamos ir para o quartel general para nos apresentarmos. Um militar de serviço disse-nos que, de vez em quando, passava ali uma carrinha militar de transporte de pessoal e que a podíamos utilizar. Após um razoável período de espera chegou um jeep conduzido por um alferes que vinha recolher uma encomenda chegada de Lisboa e eu decidi pedir-lhe boleia. A boina do alferes ostentava as armas da administração militar. No seguimento da conversa fiquei a saber que trabalhava num das secretarias do quartel que funcionava dentro da Fortaleza da Amura. Após andarmos alguns quilómetros em estrada asfaltada, ele virou à esquerda e desviou-se para uma estrada de terra batida onde entrou aí uns cinquenta a cem metros. A seguir mandou-nos descer do jeep e disse: o Seiscentos é ali, nesta direcção e, se não tivessem bagagem, até podiam ir a pé. Eu não posso passar por lá agora porque vou com muita pressa mas, quando chegar ao quartel, mando um motorista para vos apanhar de novo e levar-vos lá. Daqui a um quarto de hora estarão de novo a caminho. Mais esclareceu que o Seiscentos era o nome corrente do local onde nos deveríamos apresentar no quartel general e que o nome era a reminiscência do batalhão que lá estivera instalado e que construíra o aquartelamento.

Estava um sol tropical capaz de derreter pedras. À volta não havia uma árvore, um arbusto que desse uma réstia de sombra para conforto. Tínhamos a roupa colada ao corpo devido à transpiração. Começávamos a sentir uma sede que nos provocava vertigens, agravada pelo pó que o capim libertava e que se ia infiltrando na nossa garganta. Via-se que ainda não tinham chegado as primeiras chuvas pois o capim estava completamente seco. Durante três quartos de hora, não passou no local absolutamente ninguém. No entanto víamos que, na estrada alcatroada, passavam, com alguma regularidade, carros civis e militares. Esgotados decidimos regressar à estrada asfaltada com a mala às costas e o saco verde debaixo do braço. Após cerca de meia hora, vimos aproximar-se um jeep militar que, desta vez, era conduzido por um capitão. Mal nos viu começou a abrandar e parou. Antes que falássemos perguntou-nos o que fazíamos ali. Riu-se ao princípio, mas começou logo a despejar impropérios contra os militares da caneta que não sabem o que é a vida no mato e que têm a lata de fazerem destas coisas. Esclareceu então que estávamos sensivelmente a meio do caminho entre o Aeroporto de Bissalanca e a cidade de Bissau e concluiu:

- Vocês foram execravelmente praxados! Eu vou levar-vos ao vosso destino!

E assim fez. Após um quarto de hora de viagem, deixou-me a mim na messe dos oficiais e fez questão de conduzir também o Sargento Santos à messe dos sargentos que era um pouco mais à frente.

Fiquei a odiar para sempre esse alferes que nos martirizou inutilmente. Quanto ao capitão guardo na mente a imagem de um homem bom e muito despachado.

Logo a seguir à Revolução do 25 de Abril, o revolver da recordações gerou-me a seguinte ideia que sempre guardei só para mim. Estou convencido de que a figura do capitão que então nos valeu corresponde, nem mais nem menos, à figura do popular Otelo Saraiva de Carvalho. Posso estar errado. Os anos e os tormentos que passei desde então afectaram muito a minha memória e o turbilhão das minhas recordações. Mas estou quase certo de que não estou errado. Se assim é, desejo que o Otelo tenha muita saúde e uma vida longa. Quanto ao alferes que nos humilhou inutilmente desejo que vá para o inferno quanto antes, se é que já não foi para lá, e que a terra lhe seja tão leve como o chumbo.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

MAIO DE 68? OUVI FALAR.... OUÇO FALAR .... MAS PARA MIM NÃO EXISTIU......

Maio de 68? Ouvi falar.... Ouço falar.... Mas para mim não existiu...

Nessa altura, tinha eu acabado de fazer 23 anos e o meu destino tinha-me desviado para o lado do mundo, oposto ao local onde ocorreu o Maio de 68, mais precisamente para a Guiné. Com efeito, na madrugada de 24 de Abril desse ano, quarta-feira, embarquei no Aeroporto de Lisboa, Figo Maduro, num NorthAtlas da Força Aérea e desembarquei em Bissau, nesse mesmo dia, quando já o calor apertava. A viagem foi directa.

No começo do fim de semana anterior, saí do quartel de Santa Margarida com a guia de marcha para a Guiné. Fora destacado para ir primeiro que a Companhia, com o 1.º Sargento Santos, integrando os dois a chamada comissão de quartéis. Iríamos receber o equipamento que iria ser entregue aos militares da Companhia logo à chegada a Bissau para daí continuarem, já armados e equipados, a sua viagem para o mato.

Aproveitei esse fim de semana para vadiar pela cidade de Lisboa juntamente com outros camaradas que tinham saído comigo de Santa Margarida. Não me lembro bem de tudo o que fiz nesse fim de semana. A minha intenção era comer e beber bem e esquecer o destino escrito na guia de marcha. Lembro-me, contudo, que, uma das passagens da vadiagem nocturna foi pela "Boite O Tosco", no Conde Redondo. Recordo essa passagem por causa de duas situações curiosas.

Primeira: Quando, com os meus camaradas, entrei no Tosco, que era numa cave, vieram as generosas meninas perguntar se queríamos a sua companhia e pedir que lhes pagássemos uma bebida. Curiosamente, a que se dirigiu a mim era minha conhecida, pois tinha sido minha colega nos Correios, quando por lá trabalhei. Ela reconheceu-me, corou que nem um tomate, gaguejou na fala, mas não se desfez. E eu também não. Quando soube que eu ia embarcar para a Guiné no dia seguinte, sentiu alguma compaixão mas não tardou a mudar para outro poiso.

Segunda: Entrou um grupo de marines americanos fardados e todo o mulherio do Tosco voou na sua direcção dependurando-se neles como gravatas. Guardo bem a imagem e o alarido da cena. Por informação das meninas souberam que nós íamos para a a guerra da Guiné e quiseram fazer grupo connosco. Afinal tínhamos algo de comum, pois eles também estavam de viagem para a guerra, se bem que para a do Vietname. Fizemos grupo por algumas horas e lembro-me de ter descido a Avenida da Liberdade com eles, já de madrugada, até à altura da Rua das Pretas. Aí eu desviei para a Calçada do Moinho do Vento, n.º 24, onde estava alojado. Ainda fiquei com os nomes e os números de alguns dos marines mas não sei o que lhes fiz.

Na noite do dia 23 de Abril apanhei um táxi no Campo de Santana. Ao dizer ao taxista que ia para o Aeroporto, ele, ao ver-me fardado, disse logo Figo Maduro e adivinhou que eu ia para a Guiné. Quando lá cheguei despediu-se de mim com muito afecto e desejou-me boa sorte. Também recordo bem este episódio pois foi a única pessoa que, nessa noite, se despediu de mim no Aeroporto. Havia, no barracão militar, muitos familiares dos militares que iam partir. Mas eu não tinha ninguém.

A viagem para a Guiné, no dia 24 de Abril de 1968, foi o meu baptismo de voo. E, talvez por isso, também a recordo muito bem. Fiquei impressionado com o espaço interior do avião. Os bancos eram feitos de barras e os assentos eram feitos com francaletes idênticos aos das mochilas e estendiam-se em duas fiadas: uma junto às paredes e outra em oval no interior, tipo mesa de jantar. Os militares que me rodeavam eram todos sargentos já com alguma idade que mostravam grande descontracção. Em breve puseram uns sacos a servir de mesa de jogo e começaram a jogar às cartas com os parceiros sentados à sua frente. Os de um lado e os do outro. Eu preferi não jogar e fechei os olhos para reflectir e ouvir melhor o rom-rom dos motores do avião que, por vezes, entrava numa espécie de pista de esqui dando origem a que o ruído dos motores aumentasse de imediato. A viagem demorou perto de seis horas.

A chegada a Bissau foi marcante: o sol muito quente, o bafo da humidade, a terra vermelha. Mais ao longe, podia ver o verde do arvoredo meio tapado pela bruma. Parecia que estava atrás de um espelho de água...

Estava na Guiné para preparar o aquartelamento da Companhia que iria chegar uns dias depois.

A Companhia chegou, recebeu armas e equipamento e continuou a viagem para o norte interior da Guiné, mais concretamente para o Olossato.

Lá não havia jornais, eu não ouvia rádio e a televisão não existia. E só muitos meses mais tarde é que ouvi falar vagamente de que tinha havido distúrbios de estudantes em França. Mas isso não me pareceu nada de anormal. Afinal em Portugal também os havia de vez em quando.

O Maio de 68 passou-se muito longe de mim....

terça-feira, 18 de março de 2008

UM POETA CHAMADO TARAS SHEVCHENKO

No nosso passeio, no parque de Palermo, nesse domingo cheio de sol, depois de termos saído do Jardim do Roseiral, encontrámos uma zona vedada, com muitas cadeiras brancas, onde havia já um grupo de escuteiros alinhados, bandeiras, coroas de flores e um casal com trajes regionais garridos na base de vermelhos, brancos, azuis e pretos. Depressa o recinto ficou cheio. Chegou um carro com matrícula diplomática e o cavalheiro engravatado que de lá saiu foi conduzido para a frente do conjunto, junto a uma estátua de um homem, de corpo inteiro, em tamanho natural. Os escuteiros perfilaram-se e começaram a cantar aquilo que me pareceu ser o hino nacional do país em causa, a Ucrânia.  A estátua representa "TARAS SHEVCHENKO, 1814-1861, poeta máximo de Ucrânia, bardo de la Liberdad." Ouvimos então dizer que andou por Saint Petersburg, Moscovo e Ucrânia e foi um lutador pela liberdade. 

Esta cerimónia permitiu-nos verificar que a comunidade ucraniana em Buenos Aires está organizada, pois as pessoas falavam umas com as outras em tom muito familiar. E também nos pareceu ser relativamente numerosa.

EM BUENOS AIRES PELA SEGUNDA VEZ

Estive em Buenos Aires no passado mês de Agosto, em pleno Inverno. Agora tenho a sorte de cá voltar ainda no Verão. Que diferença! A cidade agora parece-me mais descontraída e alegre. No domingo, 16 de Março, dia em que chegámos, tivemos oportunidade de passear por Palermo, um dos bairros típicos, e almoçar num restaurante nórdico - o Olsen - que, apesar de barulhento, é recomendável, pois a comida é muito boa. Depois passeámos pelo ROSEDAL DE PALERMO uma área de protecção histórica, com muitas, muitas rosas. A cidade aparece aí no que tem de mais belo. Muitos jovens de bikini ao sol, outros a correr em patins laminados, outros, por vezes famílias inteiras, passeando em triciclos com vários bancos e pedais, de modo que cada membro da família dá o seu contributo para o movimento. As crianças vão no banco da frente e divertem-se a trocar mensagens com as pessoas que ultrapassam. Depois há o lago com dezenas de barcos a pedal movendo-se tranquilamente nas águas do lago, bastante turvas por sinal. Com a temperatura à volta dos 30 graus, a cidade é mais bonita e os portenhos aproveitam bem a linda cidade que têm para se divertirem.