sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Passagem de ano em Cabo Verde - 1. As razões de uma simpatia

Nutro, desde há muito tempo, uma estima muito especial pelo povo cabo-verdiano motivada não só pelo ritmo, melodia e sentimento da sua música tradicional, principalmente as mornas e coladeras, mas também porque alguns dos militares mais amigos e valorosos do meu tempo de tropa, nos anos de 1967 a 1970, eram de Cabo Verde. Mas esta estima não seria suficiente para escolher esse destino para a passagem de ano 2012/ 2013. Já lá tinha ido há uns anos, e, por diversas vezes. O Sal foi ponto da escala nas minhas viagens de e para a Guiné onde cumpri parte do serviço militar. Numa das vezes tive oportunidade de visitar a Ilha. E em 1998 tive o privilégio de lá ir a convite do Banco de Cabo Verde onde acabei por fazer bons amigos. Eles proporcionaram-me então uma visão do país que mantive até hoje e que, devo confessar, estava com receio de ver desfeita. A par dessa estima, houve uma razão afectiva especial para lá ir. É que a diáspora emigratória que afecta a generalidade dos jovens portugueses também me atingiu, levando para a Ilha de Santiago uma das minhas filhas. Fazer turismo em Cabo Verde não é fácil. Há uma viagem de mais de quatro horas até um dos dois aeroportos internacionais: no Sal ou na Praia. Mas depois, para visitar outras ilhas, há uma complexa teia de dificuldades que é preciso ultrapassar. E a verdade é que as coisas por vezes não funcionam lá muito bem e só com muito boa vontade são superadas. Ainda em Lisboa, o embarque, operação que, na generalidade das companhias aéreas, é simples e rápida, na companhia cabo-verdiana pode arrastar-se por muito tempo. Talvez horas. É que há o costume instituído de a generalidade das pessoas levar o máximo de bagagem possível. E, para além da que conseguem despachar para o porão, apresentam-se na porta do avião com volumes de dimensões e peso já não autorizados. Alguns são mesmo grandes atados de pacotes diversos. E lá estão vários funcionários com uma grelha e uma balança a fazer a triagem. O processo da separação da bagagem das pessoas não é fácil, originando diálogos animados. Ouvi várias vezes a expressão “tem de pagar excesso de bagagem” e um funcionário a dizer, já muito perto do excesso dos limites do tom de cortesia: “se toda a gente trouxesse bagagem como a senhora não haveria espaço para os passageiros”. No nosso caso, o voo atrasou-se significativamente e chegámos ao aeroporto da Praia já perto da madrugada. Depois de um breve descanso num pequeno hotel, aliás bastante em conta, acordámos para o pequeno-almoço. E a seguir fomos para uma agência de viagens ali mesmo ao lado, a tentar planear a nossa estadia, coisa que não conseguimos fazer a partir de Portugal, apesar da facilidade das modernas comunicações e das insistentes tentativas através da troca de emails. Na agência, uma senhora bem apresentada e simpática ia trabalhando aos poucos em três secretárias diferentes, falando ao telefone numa, vendo reservas de avião ou de barco noutra e falando connosco e tomando notas numa terceira. E assim ocupou toda a manhã poisando, sem grandes pressas, por esses três pontos, a tentar organizar-nos um programa de visita às ilhas Fogo e Brava. A manhã passou e ela acabou por recomendar que fôssemos almoçar, acrescentando que, quando regressássemos, já teria tudo pronto. E aí fomos nós pela rua fora, passámos num miradouro a que chamam Cruz de Papa, com a estátua do João Paulo II que ali celebrou missa em Janeiro de 1990. Descemos a ladeira e almoçámos num bar da Praia do Quebra Canela. Havia várias pessoas na praia apesar de não ser a época de verão. O regresso à agência implicou a subida da ladeira para a Cruz de Papa com um sol escaldante a bater-nos nas costas. Quando chegámos à agência de viagens o programa estava organizado e a conta feita. Mas, para pagarmos, os cartões de crédito não serviam. E então tivemos de reunir os nossos cartões multibanco e fazer diversos levantamentos até reunirmos o dinheiro necessário. Mais tarde pude verificar que cada um dos levantamentos nos custou oito euros. E que os catões de crédito, com excepção de um ou outro hotel, não são aceites como meio de pagamento. Liquidada a conta dirigimo-nos de imediato para o porto para apanhamos o Fast Ferry Kriola para a ilha do Fogo.

Praia Quebra Canela
Praça João Paulo II

sábado, 12 de janeiro de 2013

O Dicforte está de volta


A última postagem foi publicada há já mais de meio ano. É muito tempo de inércia para um bloguista, mesmo não assíduo. Foi um longo silêncio, uma espécie de morte lenta, que só não o foi porque, afinal, o Dicforte está de volta.

E, entretanto, aconteceram tantas coisas importantes que mereciam ser partilhadas…

A vida das pessoas é constituída por linhas, parágrafos, páginas, capítulos e livros. Mas é sempre difícil dizer em qual destas gavetas é que vamos arrumar determinada situação. É o que acontece agora comigo. Comodamente digo apenas que virei mais uma página na minha vida, embora seja evidente que, racionalmente, deveria falar de mais um livro.

É que, passei pela inevitável experiência de, na empresa onde trabalhava, ao fazer 67 anos, me virem dizer que afinal já estava velho para trabalhar e que o melhor era negociar a saída. Não foram estas as palavras usadas, mas aprendi na vida a ouvir aquilo que as pessoas me querem dizer e não as palavras que usam para o fazer. Era a verdade nua e crua a entrar em mim e a paralisar-me porque nunca esperei ouvir tal chamada à realidade.

Estou velho para trabalhar e eu não me tinha dado conta disso.

 O processo foi relativamente fácil. Pusemos um baralho de cartas em cima da mesa e retirámos, logo à partida, o naipe de copas. A razão é que este naipe é representado por corações e, numa situação destas, não há espaço para pieguices. Todos os restantes naipes do baralho, paus espadas e ouros, este com maior destaque, foram importantes para chegarmos a um acordo, eu e os representantes da empresa.

E aí está. A partir do último dia de 2012, estou na situação de reformado.

 Vejo-me agora a acordar para o facto de passar a integrar o enorme grupo social da terceira idade, dos cidadãos descartáveis, dos que pagaram toda a vida para sistemas e subsistemas de segurança social e que agora estão a ser acossados pelos governantes com cortes nas pensões e na assistência.

Eu já ouvia dizer que os reformados não estavam a ser bem tratados. Mas só agora me estou a dar conta de que, pior ainda, estão a ser mal tratados. E pelo que leio na imprensa, se as instituições funcionarem, irá ser a ganância sobre os reformados que irá determinar a inconstitucionalidade de parte do orçamento estatal para este ano. E se isso acontecer, os miúdos do Governo merecem todos uma boa palmada no rabo.

Uma vez virada a página, subsiste a vantagem de mais tempo disponível para o Dicforte ser mais assíduo. Até já.